Para que o tema proposto possa ser útil para os leitores, um conhecimento sólido sobre o baço e suas funções é
primordial, claro está, sem esquecermos dos outros órgãos. Sem um conhecimento
profundo do baço, dificilmente conseguiremos entender o processo ou processos
que envolvem a digestão, de forma eficaz e correcta, as características da
nutrição e dietética, na perspectiva oriental.
Tal como nos diz Sónia Hirsch[1]
“ o bom mestre diria ao herói que a
tradição medicinal do oriente manda tratar os distúrbios primeiro com
alimentação; se não adiantar, com ervas; e só em último caso com agulhas e
massagens”. Mudar de hábitos é o passo fundamental para nos curarmos. E
mudar, para muitas pessoas é o mais difícil. Acrescentando que preferem
tratamentos mais violentos, que resolve a dor mas não elimina as causas.
É fundamental o terapeuta conseguir que o seu paciente
mude de hábitos, quer eles sejam alimentares ou não. Só depois destas mudanças
é que os efeitos da medicina tradicional chinesa terão o efeito tão desejado e
tão eficaz.
Para que as mudanças sejam eficazes e o paciente as
compreenda, é necessário o terapeuta ter o conhecimento profundo das funções do
baço e tudo o que lhe está associado. A partir de agora centrar-nos-emos nesse
conhecimento e procuraremos, de forma clara e objectiva, adquirir os
conhecimentos sólidos que nos permitam atingir este patamar de conhecimento,
fundamental na nossa prática diária, quer em clínica quer a nível pessoal.
O Baço, segundo Ross[2],
“ depois do Qi dos rins (Shen) que é a base das energias pré-natal do corpo, o
Qi do Baço/Pâncreas (Pi) é considerado a base da vida pós-natal”. Logo, aqui,
vemos a importância primordial do baço: é ele o responsável por retirar a
energia vital dos alimentos que nos permite viver. Qualquer desarmonia no baço
prejudicará este processo e, consequentemente, prejudicará a nossa vida.
Como diz Maciocia[3]
«a principal função do Baço (Pi) consiste
em auxiliara digestão do Estômago (Wei) por meio do transporte e da
transformação das essências (Jing) alimentares, absorvendo a nutrição dos
alimentos e separando as partes puras das impuras. O baço (Pi) é o sistema
central na produção de Qi: a partir dos alimentos i líquidos ingeridos, extrai
o Qi dos alimentos (Gu QI), que é a base para a formação do Qi e do sangue
(Xue)».
Por isso, numa primeira parte procuraremos definir e
compreender todas as funções do baço e suas implicações na harmonia do nosso
corpo.
Funções do baço
Como vimos atrás, o baço é responsável pela transformação
do Qi dos alimentos em Qi pós-natal que é essencial ao processo da vida humana.
O baço/Pâncreas tem como funções:
a) Regular a
transformação e o transporte;
Como nos diz Ross[4]
“ os alimentos e as bebidas, sob
influência do Qi do baço/Pâncreas, são digeridos e separados em fracções puras
e impuras… as impuras passam do intestino delgado para o Intestino grosso, onde
se faz a absorção e depois á bexiga para a excreção. A fracção pura é enviada…
aos pulmões onde é transformada em Qi, sangue e Jin Ye (Líquidos Orgânicos) ”.
Logo, se a função do baço está em desarmonia, não haverá
suficiente energia e sangue e poderá levar a deficiência de Qi e de sangue e,
possivelmente, estagnação de líquido orgânico sob a forma de Humidade e
Mucosidades. Afectará, também a digestão, uma vez que o baço é o principal
órgão (Zang) da digestão, trazendo alterações desarmoniosas alimentares.
b) Regula a parte
carnosa dos músculos e os membros
Se tivermos um Qi de baço forte, harmonioso, então as
funções de transporte, movimento e de transformação estarão a fazer o seu
trabalho, isto é, haverá uma boa provisão de Qi e de Xue.
O Baço extrai o Qi dos alimentos para nutrir todos os
tecidos do organismo. Este “QI Refinado”, como nos diz Maciocia[5],
é direccionado para os músculos, particularmente os referentes aos membros.
Caso o Qi esteja em deficiência, não chegará aos músculos, logo teremos pessoas
cansadas, com músculos fracos e, em casos mais graves, poderá dar-se um
atrofiamento dos mesmos. O estado do baço
é um dos factores mais importantes para determinar a energia física da pessoa.
“O Simple Questions
no capítulo 44 diz: o baço (Pi) governa os músculos… se o baço apresentar
Calor, haverá sede e os músculos estarão debilitados e atrofiados. No capítulo
29 diz: os quatro membros dependem do estômago (Wei) para o Qi, mas o Qi do
Estômago somente poderá alcançar os meridianos por meio da transmissão do baço.
Se estiver afectado, não poderá transportar os fluidos Corpóreos (Jin Ye) do
estômago e os quatro membros não poderão receber o Qi dos alimentos.”[6]
c) Governa o sangue
(Xue)
Tal como um verdadeiro governo, que tenta manter a ordem
pública, o baço é responsável por manter o sangue dentro dos vasos, isto é,
manter o sangue unido.
Logo, se o Qi do baço é saudável, o Xue circulará por
todo o nosso corpo e manter-se-á nos vasos sanguíneos, caso contrário, com o Qi
do baço deficiente, o sangue poderá sair dos vasos e provocar hemorragias.
Mas o papel do baço não fica por aqui. È fundamental para
a elaboração do sangue, também. O Baço extrai o Qi dos alimentos e forma o
sangue no Coração (Xin) com o auxílio do Qi Original do Rim (Shen). Assim, tal
como Maciocia[7],
podemos afirmar que o Baço é o sistema central e essencial para a produção,
tanto do Qi como do sangue. Por isso, nos nossos tratamentos, sempre que
desejarmos tonificar o sangue, deveremos tonificar o baço.
d) Mantém os órgãos fixos / Controla a
ascendência do Qi
Tal
como nos diz Maciocia[8] “o Baço produz um efeito de elevação ao longo
da linha média do corpo”, isto é, a força que faz os sistemas internos
permanecerem no seu local correcto.
Se o
Qi do baço estiver deficiente, a sua função de elevar o Qi estará, também,
deficiente e poderá provocar o prolapso dos órgãos, tais como o útero, rim,
bexiga, estômago ou o ânus.
O
baço retira o Qi refinado dos alimentos, ou melhor, do Qi dos alimentos, e faz
com que ascenda até aos pulmões e coração.
Tal
como já falamos o Qi do baço ascende e o Qi do estômago descende, num movimento
coordenado, especialmente importante, no processo digestivo: o Qi puro sobe e o
Qi impuro desce e é excretado.
É na
harmonia deste processo ascendente e descendente que o suave fluxo de Qi se
deve fazer no nosso organismo. Só assim o Yang puro ascende para os órgãos dos
sentidos superiores e o Yin impuro desce para os dois orifícios inferiores.
Caso
esta harmonia seja desfeita, instala-se um processo desarmonioso e a doença
acaba por se instalar.
e) Abre-se na boca e manifesta-se nos
lábios
É
com o mastigar que são preparados os alimentos para que o baço retire o Qi
destes, o transforme e o transporte. Logo, a relação da boca com o baço.
Diz
o Spritual Axis[9], no capítulo 17: O Qi do baço conecta-se com a boca; se o baço
for saudável, a boca pode sentir o sabor dos cinco grãos”.
Um
Qi normal dará um paladar bom e os lábios ficarão rosa e humedecidos.
f) Abriga o Pensamento
Para
a MTC, o baço é a residência do pensamento, isto é, o baço influencia a nossa
capacidade de pensar, estudar, concentrar, determinar e memorizar. Tal como diz
o nosso povo: a barriga vazia não nos deixa pensar.
Para
que as nossas capacidades intelectuais estejam harmoniosas necessitamos de um
Qi de baço forte. O Baço, o Rim e o coração influenciam o pensamento e a
memória, mas de maneiras diferentes. O baço influencia a nossa capacidade para
o pensamento para o estudo, concentração e memorização para o trabalho escolar;
o coração abriga a mente e facilita-nos o pensamento claro para resolvermos os problemas
da vida; o rim nutre o cérebro e influencia a memória recente.
É
importante para o nosso estudo, também, sabermos que o baço odeia humidade,
pois esta obstrui facilmente o baço: na desarmonia de transporte e
transformação poderá ocorrer distensão abdominal, alterações urinárias ou
secreções vaginais.
O
Baço é a origem do nascimento e do desenvolvimento, pois desempenha um papel
fundamental em nutrir o organismo e promove o desenvolvimento.
[1] HIRSCH, Sónia, Manual do
herói ou a filosofia chinesa na cozinha, 2ª edição, Brasil
[2] ROSS, Jeremy, Zang Fu, sistemas de órgãos e Vísceras da
medicina Tradicional Chinesa, 2ª edição, Roca, 1985,S.Paulo.
[3] MACIOCIA, Giovanni, Os fundamentos da medicina Chinesa,
Editora Roca, S. Paulo, 1996
[4] ROSS, Jeremy, Zang Fu, sistemas de órgãos e Vísceras da
medicina Tradicional Chinesa, 2ª edição, Roca, 1985,S.Paulo.
[5] MACIOCIA, Giovanni, Os fundamentos da medicina Chinesa,
Editora Roca, S. Paulo, 1996
[6] Idem
[7] Idem
[8] Idem
[9] Idem
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